terça-feira, 14 de junho de 2011

SIGILO ETERNO

Todas as nações têm seus segredos.
Nações são como pessoas.
Algumas coisas querem lembrar, outras querem esquecer, outras preferem contar para seus analistas e terapeutas, outras levam para os túmulos, por receio de julgamentos ou por reconhecerem as culpas que possuem.
Mas as pessoas sempre sabem, e lidam, com essas recordações e lembranças, mesmo que de forma oculta, para poder usar essa memória como fator de crescimento pessoal, de aprendizado ao longo da vida, e como referencial de cotejo entre comportamentos, reações, análises e avaliações íntimas ou exteriorizadas.
Nas sociedades e países o processo é semelhante.
A história registra fatos e acontecimentos, que serão anotados por observadores, escritores e pesquisadores, os quais escrevem e imprimem versões históricas, que são lidas, consumidas, analisadas pelos cidadãos, ao longo do tempo, para que se construa um pensamento histórico, uma abordagem que permita a formação do que comumente chamamos de "História" e que sempre pode receber contribuições e aperfeiçoamentos pelo descobrimento de novas facetas e versões.
Muitas das nações já passaram por guerras, ditaduras, invasões, destruições, sofridas ou impingidas a outras.
Aspectos que envegonhariam a democrática Alemanha atual, tais como o nazismo e o anti-semitismo, só se converteram em história existente e disponível devido ao ético Governo Alemão do pós-guerra não querer censurar ou esconder os detalhes e os relatos das vítimas, dos perseguidos, e ainda estimular o resgate de fotos, filmes, músicas e assim por diante.
As dramáticas e demolidoras filmagens de Nagazaki e Hyroshima, quando muitos milhares de japoneses morreram em segundos, derretidos pelas duas bombas atômicas lançadas do avião militar norte-americano chamado Enola Gay, fazem parte de uma história aterradora, cruel, mas que todos os cidadãos do mundo podem acessar e conhecer por livros, filmes, sites, blogs etc.
A ditadura do sanguinário e cruel General Augusto Pinochet, que traiu a república eleita democraticamente no Chile, pois era cargo de confiança do Presidente Allende, a quem ajudou a levar à morte, se tornou revelada em toda a face da terra, graças aos registros históricos, a livros, jornais, e pesquisadores, que ainda hoje relatam o golpe ocorrido naquele outro 11 de setembro, só que de 1973.
O número onze, como duas torres paralelas pelos dois números um que o compõem, virou história novamente quando em 2001, naqueles mesmos dia e mês, entrou para a história, também, com o atentado perpetrado contra dois prédios de New York, o que levou à morte muitos cidadãos americanos, vítimas de uma guerra não declarada, que já se travava entre EUA e grupos armados no Afeganistão, Paquistão e Iraque.
Guerra que virou aberta, declarada, quando Bush mandou invadir e bombardear esses países, sob o pretexto de armas de destruição em massa, que a história recente mostrou serem inexistentes, fruto de mentira oficial, e outros interesses menores.
Em 1997 o Presidente da Alemanha Democrática atual presenteou a História com seu pedido de desculpas formal e oficial ao povo Espanhol ao reconhecer que, entre 1936 e 1938, a Legião Condor e seus militares e aviões alemães, a mando do sádico, recalcado e pernicioso Adolf Hitler, bombardearam a cidade de Guernica, e muitas outras, depois transformada em quadro dramático pelo pintor Picasso.
Ou seja, 61 anos depois de desencadeado o golpe militar contra a Republica Espanhola, democraticamente eleita, golpe militar chefiado e comandado pelo simpatizante de Hitler e Mussolini, o General Franco, o fato do apoio alemão nazista contra a Espanha se confirma e entra para os anais da História Mundial.
Muitos são os exemplos existentes, e registrados em livros, sobre a importância de os seres humanos receberem informação verdadeira, e de boa procedência, para que se possa formar os mosaicos históricos, cronológicos, sócio-políticos, econômicos, que serão os portais do conhecimento, os referenciais para as opções e decisões, que pessoas e sociedades tomarão ao longo de suas vidas e existências.
No Brasil de hoje, redemocratizado desde 1985, quando Trancredo Neves foi eleito, ainda de forma indireta, para presidir nosso país, muitas escaramuças são enfrentadas, muitas armadilhas são urdidas, para evitar que o povo Brasileiro fique bem informado sobre seu passado, e mesmo seu presente, prejudicando suas escolhas futuras.
Recentemente a Câmara Federal apreciou, e aprovou, novos patamares nos prazos que documentos oficiais deverão cumprir até serem liberados pelo governo, para se transformar em história oficial e para alimentar o conhecimento, e ajudar a formar o saber.
Sabe-se que alguns assuntos, por dizerem respeito a relações internacionais, a investimentos, a declarações de guerra, nem sempre podem ser prontamente liberados, pois por suas naturezas estratégicas poderiam desencadear crises e expor países a situações periclitantes e incômodas.
Existe ainda a possibilidade de se passar a saber de verdades que foram retocadas, maquiadas ou mentidas, que demoliriam mitos e mistérios, que muitas vezes ajudaram a construir ficções, como fortunas pessoais, adultérios, gestos de covardia, e outros aspectos menores do comportamento humano.
E ai está o livro do pertinente escritor Peruano, Vargas Llosa, chamado a "Verdade das Mentiras," que bem demonstra a empulhação que o mundo sofreu em muitas publicações inescrupulosas, como se documentos oficiais fossem.
Também recentemente, em nossa sub-tropical nação, tentou-se retirar da Galeria do Senado um episódio dos anos 90, quando o ex-Presidente Collor foi levado à renúncia e impeachment pelo Poder Legislativo Federal, acusado de operações financeiras pouco ortodoxas mal explicadas, feitas por seu assessor especial Paulo Cesar Farias, o PC, que apareceu morto a tiros, em praia de Alagoas, anos depois.
Assim como tentou tirar a cobertura dos fatos atinentes ao afastamento de Collor, da Presidência do Brasil, o Presidente do Senado José Sarney, voltou atrás e mandou recolocar esses documentos e fotos na aludida galeria.
Manipulação informacional, que poderia redundar em censura histórica.
Por mais estranho que possa parecer, Collor quando se elegeu Presidente, foi após o mandato de Sarney na Presidência, e o fez movendo violenta campanha pessoal e política, chamando Sarney de "marajá" e prometendo acabar com os "marajás" e a corrupção existentes no governo e órgãos públicos brasileiros.
Collor foi cassado, mesmo renunciando, e voltou a se encontrar com Sarney, agora ambos no Senado da República, eleitos que foram para esses cargos legislativos.
Dois atores da história recente do brasil, Collor com o impeachment sofrido e a não bem explicada Operação Uruguai, e Sarney com o Plano Cruzado que comandou.
Pois bem, esses dois personagens destacados, nem sempre lembrados por méritos pessoais ou por suas gestões, estão recomendando que o Senado não homologue e referende o texto aprovado na Câmara.
Alegam eles, que alguns aspectos e fatos não podem, jamais, ser divulgados e que muitos documentos, relatos e passagens históricas, da Nação Brasileira, devem ser condenados ao "sigilo eterno", exatamente isso, os brasileiros não teriam o direito de, um dia, saber algumas ou muitas, verdades sobre a sua real e verdadeira História.
Apesar de todas as lições oferecidas por outros países, mesmo os que passaram por grandes traumas e que ainda tiveram a grandeza de reconhecê-los e narrá-los.
Por decisão estimulada pelos dois ex-presidentes brasileiros cogitam ambos de convencer legisladores federais eleitos pelo voto democrático da sociedade brasileira a esconder fatos dessa mesma sociedade.
Imangine-se, numa casa ou empresa, um empregado contratado e pago, escondendo coisas e relatos de seus patrões, por entender que eles não precisam saber de tudo.
Políticos e legisladores não passam de empregados do povo brasileiro e não têm o mínimo direito, nem de pensar numa possibilidade dessas, de esconder algo de quem lhes paga os salários e que os colocou nos cargos temporários que ocupam.
As verdades históricas, doam a quem doerem, são patrimônio histórico e pertencem a seus legítimos proprietários, os cidadãos brasileiros.

Um comentário:

André Guillamelau disse...

Foi com imenso prazer que li e reli esta pérola de texto que resgata de forma brilhante fatos marcantes da história da humanidade. Liberdade de expressão é uma ferramenta fantástica da democracia ainda mais quando utilizada de forma coerente e sem nenhum pingo nos "is". Obrigado Danilo por me dar este prazer e poder dormir com a certeza que ainda temos grandes homens com sábias palavras!!!