quarta-feira, 17 de junho de 2009

O exemplo do nazismo e o controle da informação como instrumento de poder




Além das atrocidades cometidas contra vários paises e etnias, o nazismo foi o responsável pela destruição de quase toda a Europa e da própria Alemanha.
Joseph Goebbels, o inescrupuloso e famigerado ministro da informação do estado nazista, marcou sua atuação à frente da propaganda do nazismo, justamente com a repetição de mentiras e frases criadas para realçar os princípios nazistas, bem como o endeusamento de Hitler.
No território alemão, depois de grande crise econômica, da derrota da primeira guerra mundial e do fim da República de Weimer, encontrou as condições psico sociais familiares, produtivas e coletivas ideais para seus propósitos.
Uma sociedade derrotada, profundamente afetada pelas péssimas condições macroeconômicas, com a sua moral coletiva devastada pela aguda inflação.
Esse foi o quadro propicio para que grupos de aventureiros e mercenários tomassem o poder na Alemanha e passassem a impor novas regras “salvadoras”.
Já foi dito que o nazismo só foi possível graças à reunião, no governo da Alemanha, de um expressivo número de facinoras e delinquentes, aproveitadores da frágil situação da democracia naquele país.
Aproveitando-se de um momento histórico sensível para a nação alemã, esse grupo de criminosos, fantasiados de salvadores da história e das tradições culturais, tomou de assalto o poder, fundando o regime nazista.
Além da fortíssima promoção interna do movimento e de seu líder máximo, foram investidas significativas somas para levar aos descendentes alemães, em vários paises do mundo, a visão de que ao nazismo era a salvação da Alemanha e dos alemães.
Revistas, jornais, encartes, programas radiofônicos e todo o tipo de propaganda escrita e sonora, eram os únicos meios da época, foi maciçamente utilizada para impregnar as mentes e corações de alemães, em todo o mundo.
Filmes foram realizados, grandes diretores de cinema e distribuidoras contratadas em toda a face da terra, para completar a cobertura mundial de imagens saudáveis, positivas, entusiásticas, que mostrassem uma sociedade feliz e realizada, tudo graças ao nazismo e seu líder maior.
Para motivar corações e mentes, as imagens complementavam a catequese salvadora.
Em várias cidades brasileiras, com grandes contingentes de cidadãos de origem alemã, revistas e jornais eram enviados diretamente de Berlim, dentro do programa de formação de opinião.
Muitos descendentes de alemães, que jamais foram nazistas ou concordaram com os métodos de Goebbels e Hitler, recebiam essas publicações como enviadas por quilo que eles tinham a idéia de ser o governo normal de seu país de origem. Na imaginavam que estavam sendo iludidos e enganados por uma maquina montada para tomar o poder e dominar o mundo, por meios inescrupulosos e criminosos.
Esse ponto é muito importante para estabelecer um paralelo com o mundo atual.
Os meios de difusão da informação são muito mais poderosos, os recursos existentes para fazer propaganda explicita e subliminar são gigantescos e os interesses de poder econômico, político e militar, ilimitadamente incomparáveis com a época dos anos 30.
E a Alemanha nos serve, mais uma vez, como exemplo.
Se o nazismo foi a inusitada reunião de pessoas inescrupulosas no poder, com grandes meios de informação a seu dispor e recursos financeiros ilimitados para mentir e manipular, qual a análise que podemos fazer da situação atual e das disputas pelo poder mundial?
Um caso pontual, com repercussões em todo o planeta, e que pode ser exemplar para analisar essa comparação entre o período pré-segunda guerra mundial e os dias atuais, é a guerra americana movida contra o Iraque.
O mesmo país que foi armado e preparado pelos Estados Unidos para fazer frente e desgastar o Irã, que, após a revolução de 1979, tornou-se um adversário dos americanos.
A revolução Iraniana, como já foi dito em artigo anterior, teve como uma das suas motivações o golpe de 1953, promovido em conjunto pela Inglaterra e EUA, para derrubar o regime democrático do primeiro-ministro Mossadegh, pelo domínio da refinaria de Abadan, que processava o petróleo do Irã.
O Iraque foi equipado com as armas mais sofisticadas fornecidas pelo exército americano e manteve uma guerra de muitos anos contra o Irã.
Muitas armas e mísseis de grande poder de destruição, fornecidas pelos americanos, permaneceram em solo Iraquiano, para o caso de uma recaída nas hostilidades com o país vizinho.
Muito anos depois, por interesses geo-politicos petrolíferos e militares, os EUA moveram duas guerras contra o Iraque, uma pela alegada defesa do Kuwait e outra pela perigosa ameaça de “armas de destruição em massa” em poder de depósitos existentes no Iraque, e que precisariam de condenação do mundo livre.
Especialistas de todo o mundo, a mando da ONU, inspecionaram o Iraque, demorada e exaustivamente, não conseguindo constatar a existência de armas químicas ou biológicas, dentro daquilo que os americanos tanto repetiam.
Mesmo assim, após o 11 de setembro, para atacar uma organização terrorista no Afeganistão, as forças militares americanas invadiram o Iraque, sem qualquer declaração formal de estado de guerra, ou amparados por resolução da ONU, e promoveram uma destruição brutal daquela sociedade, não poupando nem os sítios e monumentos históricos de uma região essencial para a compreensão da história antiga, da arte e das ciências.
Como ficou comprovado pelo depoimento dos representantes da ONU, nada havia no Iraque que justificasse o ataque àquele país. A ONU não referendou a agressão e as armas encontradas em território iraquiano foram os mísseis que haviam sido levados pelos americanos para que o Iraque atacasse o Irã, na guerra dos anos 80.
Mas o que queremos abordar, com o relato dessas tragédias e crimes cometidos, é o aspecto do uso da informação pelos governos dos dois presidentes da família Bush.
Uma imensa campanha mundial foi movida por todos os meios de comunicação, convencionais e eletrônicos, físicos e virtuais e a opinião pública foi colocada através do medo e de ameaças numa operação planejada de manipulação e controle de informações.
Os ataques americanos, como um gigantesco “game” foram transmitidos on-line, real-time, por fibra ótica, cabos submarinos, satélites, jornais, rádios, sites, blogs, para que o mundo todo sentisse medo daqueles “assassinos” barbudos e bigodudos que tinham ousado provocar a “santa e democrática ira” dos salvadores soldados americanos, verdadeiros robôs tecnológicos a serviço da “democracia”.
Paralelamente, tendo o medo como principal arma e os métodos macartistas como pano de fundo, a sociedade americana aprovou leis de exceção, que permitiam desrespeitar direitos individuais básicos e elementares, como o abrigo do lar e do domicilio das pessoas, como o direito a advogado em caso de prisão e a obrigação de notificar prisões e detenções para as autoridades judiciais. A imprensa foi censurada, o direito de opinião foi diminuído e disponibilizado somente para aqueles que concordavam com as ações do governo Bush.
Prisões secretas foram implantadas pela CIA em várias partes do mundo, Guantanamo foi transformada de base militar em um palco de horrores, torturas e detenções ilegais, algo muito parecido com os campos de concentração, que os americanos tanto criticam em seus cíclicos filmes sobre o nazismo.
Essa parábola nos mostra de forma simples e acessível como pode se formar uma instãncia de poder que engane a cidadania de uma sociedade, que manipule a opinião pública e que conduza um pais a uma situação de segregacionismo e racismo, como foram os momentos registrados pela mídia, no tocante a migrantes e descendentes de orientais e asiáticos.
O que diriam Hitler e Goebbels, se pudessem ter assistido, sobre a performance dos dois presidentes Bush, diante da maestria que demonstraram ao impingir o medo à sociedade americana, em censurar a imprensa e criar a visão de povos inferiores que ameaçavam, e poderiam, dominar a desenvolvida e civilizada nação norte-americana?
Essa pergunta é para ser respondida por uma análise profunda, mais uma vez, do exemplo alemão, após o episódio nazista.
A Alemanha implantou uma nova Constituição Democrática e, 60 anos depois, ainda a cumpre e sua imprensa é livre e critica, atuando em favor da sociedade.
O grande risco, para as democracias, é justamente quando interesses partidários se enquistam no poder, criam um núcleo paralelo, que acaba sendo maior que o estado formal, e passam a dar as cartas, conforme os interesse pouco escrupulosos de seus membros, famílias e grupelhos, de vontades criminosas.
A reflexão vale para todas as sociedades. Principalmente em nossa América Latina, tão apressada em seguir exemplos pouco estudados.
Por isso é que o revezamento no poder, e do poder, é uma regra democrática essencial. A renovação traz a mudança e evita o golpe e a mentira como instrumentos de dominação e perpetuação de governos ou regimes.

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Personagens citados neste artigo:

Adolf Hitler- cidadão austríaco, nascido na cidade de Braunau. Abandonou a escola aos 16 anos e foi para a Alemanha, em Munique, onde se ligou a movimentos extremistas de direita. Iniciou sua carreira política no Partido dos Trabalhadores Alemães, depois transformado no Partido Nacional-Socialista dos Trabalhadores, cuja sigla nazi deu origem a denominação nazista ao movimento que liderou. Utilizou a propaganda, a violência e o terror. Tentou um golpe em 1923 e, na prisão, escreveu o livro Mein Kamp(minha vida). Liderou o movimento anti-semita, invadiu vários paises, implantou os campos de concentração para eliminar todos que não fossem considerados “arianos puros”.
Foi Chanceler alemão eleito entre 1933 e 1934, e ditador entre 1934 e 1945. Foi dado como morto em maio de 1945, com a derrocada da Alemanha e o final da segunda guerra mundial.

Joseph Goebbels- em 1933 foi nomeado ministro da propaganda por Hitler. Implantou o conceito de que repetir muito uma mentira a transforma em verdade. Utilizou todos os meios de comunicação de massa e organizou espetáculos grandiosos para emocionar e motivar multidões. Ajudou a esconder a verdade sobre os campos de concentração e extermínio contra judeus e inimigos do nazismo. È citado como tendo se suicidado junto com seus familiares, ao final da guerra em 1945.

Macartista- Alusão a Joseph MaCarty, senador americano pelo partido republicano que dirigiu comitê do congresso contra cidadãos sobre os quais levantava suspeitas de serem comunistas. Manipulou depoimentos, usou o poder para intimidar, difamar e induzir ao suicídio, vários artistas e diretores de cinema, teatro, televisão e jornais. Organizou expurgos e listas negras com nomes de pessoas que perseguia por motivos políticos. Gerou perseguições em meio de comunicação para prejudicar inimigos políticos.Ao final de seu mandato foi advertido e censurado pelo Congresso americano, em 1954.

Família Bush – Presidentes norte-americanos, pai e filho, que exerceram a presidência do país respectivamente na ultima década do século XX e primeira do século XXI. Com nomes iguais, ambos chamados George Bush, se caracterizaram por governos promotores de guerras e atendimento de grandes interesses econômicos. George pai fez a primeira guerra contra o Iraque, a operação tempestade no deserto, no inicio dos anos 90. No governo de George filho, além da segunda guerra do Iraque, e outras, ocorreu o escândalo da Enrom, a falta intencional de regulação do governo sobre operações bancárias e negócios financeiros, e foi gerada a crise especulativa financeira, que ocasionou enorme e profunda crise econômica, com a contaminação de todo o sistema bancário, em todo o mundo. Ambos deixaram uma herança de crise economica pesada e comprometimentos bélicos constrangedores.

sexta-feira, 12 de junho de 2009

Um projeto de Nação pode salvar o Brasil da podridão




O conceito de Estado, como ordenador da conduta humana, foi um dos maiores avanços na construção do espaço coletivo das sociedades.
Esse conjunto de conceitos jurídicos, sociológicos e políticos, se constitui num grande pacto ético que garante a igualdade, a impessoalidade e a legalidade no trato da coisa pública. Representou a evolução das sociedades do poder absoluto dos reis para o regime das leis.
Se conforma como um dos mais importantes avanços civilizatórios, permitindo o estabelecimento do respeito pelas liberdades individuais de escolha de padrões de vida, associadas à obediência de regras e leis que governem os direitos e espaços públicos.
Além de muitos estudiosos que ajudaram a construir esse elenco de normas e doutrinas, um brasileiro ilustre, Ulysses Guimarães, deixou em sua rica herança para o Brasil, o seguinte enunciado:
“o Estado é uma criação do ser humano para servi-lo e não para servir-se dele”.
Essa frase enfeixa tudo para o que o Estado foi criado.
Um conjunto de conceitos e instituições que têm por função precípua a organização dos elementos transitórios e permanentes que regerão a vida dos cidadãos entre seu nascimento e sua morte.
Assim, o Estado é um instrumento a que todos os cidadãos se submetem, dando uma parte significativa de seu patrimônio, e de suas identidade e individualidade, para ter organização e serviços que agreguem normalidade e qualidade de vida para todos.
A existência de Estado se complementa com a Constituição, votada e aperfeiçoada por toda a sociedade, através de seus representantes democraticamente eleitos, e renovados periodicamente, como previsto na lei magna.
Com esses mecanismos, espera a sociedade, contar com uma organização abrangente, transparente e que funcione dentro do previsto no elenco legal adotado para reger as diferenças e as relações entre os diferentes e entre os hipo e os hiper suficientes.
Quando se diz que os cidadãos, para contar com a estrutura estatal, pagam de seus bolsos valores elevados se justifica essa assertiva com a compreensão de que a existência de três dimensões de poder, legislativo, executivo e judiciário, são mantidas e regiamente remuneradas, na expectativa do bom e eficaz funcionamento dessas instâncias.
Hoje, por dados recentemente divulgados, cada cidadão brasileiro dá ao Estado um total de quatro meses e sete dias de seu trabalho, para manter essa estrutura. Ou seja, mais de um terço de seu trabalho e produção de todos os anos de sua vida.
Logicamente, apoiados na Constituição de nosso país, contamos que esse elevado valor, tirado literalmente do suor laboral de nossa população seja merecedor de respeito e de cuidadoso controle e prestação de contas por quem o gasta.
Ultimamente, os jornais e televisões de todo o país têm publicado assustadoras crônicas com grandes e ininterruptos escândalos.
As paginas políticas estão vazias. Não se fazem as reformas estruturais de que o Brasil tanto necessita, os legislativos trabalham, em média, três dias por semana.
Mas as seções policiais estão recheadas de assaltos aos cofres públicos com a nomeação de parentes, contratações de empresas suspeitas, pagamentos de funcionários fantasmas, gastos milionários de passagens aéreas, nacionais e internacionais, patrimônios pessoais completamente desproporcionais aos salários declarados, realização de grandes, luxuosos e desnecessários eventos e toda uma gama de operações desonestas e irresponsáveis, que só ocorrem por serem impunemente pagas com o dinheiro que a população arrecada para manter o necessário Estado.
Toda essa bandidagem perpetrada contra a sociedade continua a acontecer graças ao acobertamento pela cumplicidade, tanto da ação quanto da omissão de muitos governantes, dirigentes e legisladores, que foram eleitos pelo povo para serem os representantes e os gestores executivos dos recursos pagos para atender demandas sociais produtivas e legítimas.
Agora, para coroamento dessa enorme maracutaia que assola o Brasil, descobriu-se que o legislativo criou a figura dos atos secretos.
Pela noticia, ficamos sabendo, estupefatos, que mais de trezentos atos públicos, ou que deveriam ser, foram escondidos, escamoteados, surrupiados da opinião pública, para ocultar da sociedade, que trabalha todos os dias, nomeações de parentes e apaniguados, além de outras barbaridades escandalosas.
Já havia a corrupção explícita, agora foi criado o assalto secreto.
Tudo isso graças aos generosos orçamentos garantidos pela injusta e desnecessária carga tributária. Uma verdadeira derrama, que enche as burras da prepotência e da improdutividade de estruturas desnecessárias e cheias de parasitas.
Injusta e desnecessária, pois como está sendo comprovado pela imprensa, com muito menos se teria o mesmo estado, se não se roubasse tanto e se não ocorressem tantos desvios de finalidades nas estruturas públicas.
Enquanto esses vampiros insaciáveis chupam o sangue de nossa gente, desviando vergonhosamente recursos financeiros da nação para seus bolsos e de suas famílias, a educação, a saúde, a segurança e o transporte deixam a desejar na prestação de serviços aos cidadãos.
E os honestos e competentes servidores públicos de carreira não são valorizados ou remunerados como mereceriam.
O saneamento básico não é uma prioridade nacional, o grande capital ambiental não é preservado, é agredido e violentado, nossas praias são transformadas em fossas e cloacas e nossa juventude fica sem perspectivas de empregos e trabalho dignamente remunerados..
Muitos recursos que poderiam ser transformados em investimentos altamente produtivos são canalizados para os bolsos desses ladrões de vidas e esperanças.
Enquanto isso, somos o país dos juros mais altos, dos maiores lucros bancários e do crédito mais caro impedindo que empresas e pessoas possam empreender a ampliação da base econômica e a inovação em produtos e serviços, com melhor distribuição de renda.
A situação nos aponta a urgente e extrema necessidade de iniciarmos um processo de renovação. Um passo é renovar todo o conjunto de representantes eleitos, trazendo novos atores para o cenário político nacional, em todos os níveis.
Não reeleger, ou eleger, qualquer dos políticos que aí estão e que colaboram com esse quadro de desvios, de gastos impunes, de desrespeito, de mordomias e corrupção.
Outro passo fundamental é reunir as forças produtivas, as lideranças empresariais e sociais legítimas e honestas e começar um grande seminário permanente, com abrangência nacional e discutir que país queremos e qual o perfil político e gerencial que precisamos para nosso futuro.
Um projeto de Nação para nosso Brasil. De Nação e não de república de bananas como hoje temos e como os ladrões e corruptos desejariam continuar.
Como disse Eduardo Galeano, o grande escritor uruguaio, a única vantagem no processo de apodrecimento como esse que vive o Brasil, é que a putrefação gera o solo fértil para o nascimento de novas plantas e para a renovação do solo.
Vamos jogar a roubalheira na lata de lixo da história?


segunda-feira, 8 de junho de 2009

Crônicas do Século XXI - Autores Alemães


Livro "O Leitor" – de Bernhard Schlink

Bernard Schlink é um escritor alemão. Professor de Direito e Filosofia na Universidade de Humboldt desde 1996, escreveu vários livros. É autor premiado por seu trabalho, tendo sido agraciado com os prêmios Grinzane Cavour, Hans Fallada e Laure Bataillon. Ganhou o prêmio de Literatura do Die Welt, em 1999.
Em “O Leitor”, o autor desenvolve uma temática complexa e atual. Ele apresenta a sociedade alemã diante da questão do julgamento das atrocidades cometidas durante a segunda guerra, porém vistas e analisadas num contexto posterior.
Os personagens do romance, confrontados com as suas realidades, e com aquilo que ajudaram a realizar, respondem com as contradições humanas e com a natural dificuldade de entender o que fizeram em outros contextos.
A questão do nazismo é sutilmente citada e os campos de extermínio fazem parte da narrativa como personagens distantes. Sua pretensão é o drama humano proveniente dessas situações e das decorrências, muito distantes do ocorrido, que demonstram o incomodo de revolver períodos históricos, e humanos, muito distantes.
Interessante e louvável o esforço que escritores e cineastas alemães têm demonstrado no uso e apresentação das terríveis realidades geradas pelo estado nazista. Essa atitude é responsável pela catarse e depuração sócio política por que passou aquele país, no longo processo de sua reconstrução física, ambiental, sociológica e política. Com muita clareza e abertura, temos visto crônicas e matérias jornalísticas, documentários em cinema e televisão, nos quais a discussão corajosa é tratada sem limites, notando-se o compromisso com a verdade, sem qualquer ponta de censura ou minimização.
Esse padrão de tratamento da informação poderia servir de modelo para outras nações que passaram por situações condenadas pela opinião pública, independente se foram vitoriosos ou derrotados. Dois episódios históricos, não muito distantes de nossa atualidade, poderiam ser analisados à luz dessa atitude dos intelectuais germânicos.
Um deles ocorrido no Irã, antiga Pérsia, aconteceu em 1953. Inglaterra e Estados Unidos, agindo em conjunto, através de seus serviços secretos, prepararam e executaram a deposição do primeiro-ministro democrático Mossadegh, eleito pelo voto daquela sociedade.
O motivo de tão ampla operação era algo bem atual, o petróleo. A Inglaterra não pretendia dividir com o governo iraniano, de forma proporcional, os ganhos em petróleo e divisas, advindos da refinaria de Abadan. Construída em território do Irã, usava a matéria prima e a mão-de-obra iranianas e pretendia ficar com a “mais valia” resultante do processo. Solicitado a intervir junto com os ingleses, o governo americano se negou, inicialmente, pois essa intervenção representaria uma operação de guerra, contra um país soberano que, afinal das contas, defendia seus direitos legítimos. Com a mudança de governo ocorrida nos EUA, os novos mandatários se dispuseram a encarar o “jogo sujo” e toparam solapar o governo do Irã. Financiaram o rebotalho daquele país para ter massa de manobra na agitação e na criação de clima propício para o golpe. Enviaram um agente da Cia, de nome Kermit Roosevelt, que comandou o treinamento em explosões e sabotagem, em contra-informação e conspiração, e lhe deram recursos significativos em dinheiro, armamento e cobertura.
Fizeram o golpe, derrubaram um governo, laico e democrático, prenderam Mosadegh e o condenaram ao pior dos castigos, o isolamento e a impossibilidade de trabalhar por seu povo. Enquanto isso, colocaram o “Xá”, o títere Reza Pahlevi no poder, transformando aquela sociedade num satélite geopolítico do ocidente.
Em 1979, quando da revolução dos Aiatolás, fotos mostram faixas carregadas pelos manifestantes, onde se lia uma citação à Mossadegh.
Vinte e seis anos depois, o povo daquele país não tinha esquecido o que ocorrera em 1953. Tudo isso está relatado pelo jornalista norte-americano Stephen Kinzer, em seu livro “Todos os Homens do Xá”, que ainda coloca que essas foram as raízes do terrorismo no Oriente Médio, usado, depois, pelo presidente Bush para criar leis e medidas não-democráticas de cerceamento de liberdades individuais e censura da imprensa e da informação, além do "campo de prisioneiros"de Guantânamo.
Outro momento foi o 11 de setembro. Mas não o de 2001 e sim o de 1973, quando os EUA apoiaram e ajudaram a derrubar o governo democrático do Chile, eleito pelo voto da sociedade chilena.
O presidente Allende foi morto, o palácio presidencial, em pleno centro de Santiago, bombardeado pela força aérea e o país mergulhou numa ditadura de vários anos, com torturas, execuções e muitos exílios.
O “Xá” do Chile foi o General Pinochet, tirano ressentido, que traiu o Presidente eleito, e a nação chikena, pois era seu subordinado e ocupava cargo de confiança no governo democrático.
O território chileno foi pequeno para as suas demonstrações de força e arbítrio e o cone sul da América Latina foi transformado num palco de horrores. Não faltaram locais ermos para a colocação de campos de prisioneiros e o número de mortos e desaparecidos é, até hoje, um mistério pouco investigado.
Sobre o tema, cineastas americanos fizeram o filme “Missing”, com Jack Lemonn no papel do cidadão alienado dos Estados Unidos, que acreditava nas poucas informações que a imprensa norte-americana publicava.
Assim, o filme “Missing” e o livro “Todos os Homens do Xá”foram dos poucos trabalhos de mídia, ou informação, que expuseram essas feridas do poder americano para o mundo.
Por isso, o exemplo alemão significa muito neste momento de crise, gerada nos Eua, por movimentos especulativos de um mercado financeiro não regulado, devidamente, no governo Bush.
Essa coragem de expor suas mazelas, de realizar uma auto-critica saudável, de compartilhar com o mundo as suas contradições e preparar a nação para os momentos pós-crise, e para a renovação, colocam a Alemanha na vanguarda cultural e na liderança do processo político, que poderá representar um outro Renascimento, em pleno século XXI.
Como dizia Paulo Freire, o grande educador brasileiro:
“Das cinzas do que queimou, nascerá o novo. Que só será entendido como novo, se reconhecermos por quais razões o velho não nos serve mais”