Bin Laden e Muammar Kadafi estão mortos.
Com uma diferença de tempo pequena, ambos foram assassinados, sem julgamentos.
As acusações que sobre eles pesavam, de atentados nos EUA e na Escócia, ficarão sem as devidas respostas históricas, que seus eventuais julgamentos, dentro da lei, poderiam fornecer à opinião pública mundial.
Há toda uma cronologia ainda não bem explicada, nas duas mortes.
Na Líbia, após os primeiros movimentos da oposição popular, a ONU autorizou a Otan a realizar operação de preservação de faixa desmilitarizada para proteger civis.
Interessante que a ação da Otan se generalizou, com o fornecimento de armas militares justamente aos civis, que teoricamente deveria proteger de uma guerra, ao ponto da captura de Kadafi ter ocorrido num bombardeio da mesma OTAN, numa região de fronteira sem grandes ameaças à população.
Antes disso, a ONU reconheceu o novo governo Libio, na figura do CNT, um Conselho Nacional de Transição, quando ainda havia batalhas ocorrendo, e o governante libio, anterior, todavia estava em território daquele pais.
Governante, aliás, que nos ultimos 24 meses tinha desfilado nos Eua, recebido por Obama, na Inglaterra, com Tony Blair, na Italia, com Berlusconi,na ONU, e tantas outras autoridades, que agora declaram que ele era um ditador sanguinário, inimigo da democracia.
Mas quando estavam juntos, essas características de Kadafi não eram conhecidas? mesmo estando ele há mais de 40 anos no poder? ou os interesses nas jazidas petrolíferas da Líbia eram mais visíveis que a ditadura, hoje alardeada?
E a contraditória atitude da Onu, que mesmo recebendo a visita do dirigente Palestino para solicitar a entrada de seu território naquela organização mundial, recomendou que os palestinos fossem negociar com Israel, antes, para depois poder ser aceitos, não utilizou esse mesmo critério com o dito CNT, e muito rapidamente reconheceu o novo governo da Líbia, com uma pressa inimaginável, de apenas 3 dias?
Os assassinatos dos dirigentes da Líbia, e da Al Qaeda, são diferentes.
Um dos mortos era dirigente de uma nação, o outro de uma organização política, conhecida na imprensa mundial como ordenadora de ações terroristas.
Mas a lei, que caracteriza os Estados Democráticos não deveria ter sido cumprida, e ambos os aprisionados submetidos aos devidos julgamentos?
Como se diferenciam Estados Democráticos dos não-Democráticos, quando a lei não é cumprida, e os ritos legais não são devidamente seguidos e obedecidos?
Mesmo a condenação a pena de morte, como ocorreu no discutivel julgamento de Saddam Hussein no Iraque, necessitou de uma cerimônia alusiva.
Se o olho por olho, dente por dente, for implantado pelas nações militarmente mais armadas, e o exemplo da obediência legal for abandonado, corremos o risco de um mundo cego e desdentado, pois a vingança poderá substituir a justiça.
Num jornal da Escócia, foi estampada uma foto de Kadafi morto, com a manchete fazendo alusão que aquela imagem poderia ser uma revanche pelo atentado que derrubou um avião e matou mais de 200 civis, naquele país, e que teria sido ordenado pelo diator morto.
Se essa visão da vingança por mortos anteriores for adotada, imagine-se quantos motivos o Japão poderia ter contra os EUA, pelos milhares de mortos gerados pelas duas bombas atômicas que os americanos lançaram sobre Nagazaki e Iroshima, em 1945.
O Irã poderia querer justificar uma vingança contra EUA e Inglaterra, pelo golpe de 1953 contra o Governo Democrático do primeiro ministro Mossadegh, derrubado em golpe conjunto executado por aqueles dois paises, para dominar o mercado do petróleo da hoje nação dos Aiatolás.
A Argélia poderia querer vingar as mortes geradas pelos franceses, que tentaram manter o domínio daquela nação, em guerra sangrenta que se estendeu até 1963, onde a tortura foi aceita como instrumento normal de obtenção de informações pelo exército do General Degaulle.
O VietNam teria razão de querer vingar seus mais de 3 milhões de mortos das guerras promovidas pelo franceses e americanos, e que foram encerradas em 54 e 74, respectivamente, com as derrotas dos dois exércitos ocidentais agressores.
A Somália, ex-Eritréia, ex-colônia italiana, teria bons motivos para resgatar os episódios ocorridos em seu território, quando dominado pelo país de Berlusconi.
O ex-Congo Belga, teria fortes argumentos para uma revanche sangrenta contra os herdeiros do Rei Leopoldo II, da Bélgica, por comandar chacinas de milhares de Congoleses.
E nem pensar nas razões exacerbadas que a Africa do Sul poderia brandir para uma cruzada contra os paises brancos que implantaram o Aparteidh racial, as mortes de muitos milhares de negros, em massa, e a retirada dos direitos civis dos que eram donos legítmos daquele país, mas que tinham a pele escura.
E assim, o mundo poderia mergulhar num pesadelo ensandecido do abandono legal, do descumprimento dos ordenamentos judiciais, levado pela vingança, que se justificaria pelo simples sentimento de reparação de mortes, destruição e atentados promovidos em qualquer época, por qualquer governo, sob quaisquer condições.
O mundo precisa acordar desse pesadelo do uso da força, pelos mais fortes, pois esse argumento banal pode ser observado por nações, que, amanhã, podem vir a estar em patamar militar e armamentista, que permita essa atitude, sem qualquer respeito ou acatamento das cortes internacionais, e dos regramentos legais, por tanto tempo construidos pelo avanço e pela civilização.
Ainda mais num mundo, que começa a sofrer a mudança de poder, para mãos diferentes, e que nem sempre foram tratadas com gentilezas, ou dentro das leis, que protegem os cidadãos dos paises atualmente desenvolvidos.
O estágio atual, mesmo com todas as injustiças e retrocessos, representou um avanço qualitativo importante nas relações internacionais, e a ONU precisa revigorar a observância à lei e à ordem, sob o risco de vir a ser substituida, como a sua antecessora, a Liga das Nações, o foi, por sua incompetência em mediar conflitos e pelo corporativismo burocratista que a dominou.
A ONU envelheceu, se burocratizou, está dominada por um Conselho de Segurança que é governado por apenas cinco países, com poder de veto, e começa a demonstrar o loteamento a que está submetida pelos mais fortes.
Urgente se faz uma revisão mundial, para que o conjunto de nações, que representa a nova relação de forças econômicas, e politicas, que emerge com o terceiro milênio, tome seus assentos na Organização.
Até para garantir o equilíbrio e a paz, que a ONU tem como mandato, mas que estão ameaçados por sua imobilidade, e risco de parcialidade.
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