domingo, 29 de março de 2009

O Mundo Pós-Crise

-A Responsabilidade Sócio-Ambiental
-O novo espaço de poder para a Mulher
Seminário promovido pela SOGEPLAN-SC
(roteiro da palestra apresentada no auditório da OAB, em 30.03.2009)


1-Conjuntura mundo e Brasil

-crise financeira, gerada em bancos norte-americanos, por especulação desenvolvida sobre papéis podres, emitidos sem lastro, com base na bolha do mercado imobiliário dos Eua.
A crise, por envolver movimentos especulativos de bancos e empresas, principalmente dos paises mais desenvolvidos, ameaça transformar-se em crise econômica, talvez em grande recessão ou depressão mundial. Essa crise financeira pode gerar grande restrição de crédito financeiro, afetando consumo e produção e gerando queda do pib dos paises, desemprego, perda de poder aquisitivo, e prolongada estagnação econômica, durante alguns anos.

-mundo enfrenta os primeiros sinais palpáveis, e visíveis, do aquecimento global, com grandes enxurradas, enchentes, frios e calores extremos, significativo número de pessoas atingidas pelas catástrofes naturais. Estupor e despreparo das áreas estatais dos paises atingidos, no socorro às populações afetadas e na capacidade de organização de medidas de reação e geração de alternativas.

-área cientifica gera alguns avanços importantes no desenvolvimento de novos processos de cura e enfrentamento de doenças como a diabetes, o mal de Alzheimer, o câncer e muitas outras, pelo avanço nas áreas de neurociência, da genética e da nanotecnologia.

-na área de produção de alimentos, o desenvolvimento de produtos geneticamente modificados coloca o foco da discussão, sobre o barateamento e a geração de novos alimentos, na questão política da dominação econômica do segmento, pelos laboratórios, que controlariam a tecnologia genética e os ganhos e lucros dela decorrentes.

-Brasil investiu pouco em saneamento básico, ao longo dos últimos 30 anos. Com um litoral de 8.000 km de extensão, grande número de suas praias apresenta poluição por coliformes fecais. Grandes cidades, e capitais, transformaram rios e córregos em fossas coletoras de esgotos sem qualquer tratamento. Em 2008 o Brasil devolveu verba destinada ao saneamento básico, mais de 200 milhões de dólares, ao Banco Mundial, por falta de condições de usá-la.

-várias cidades brasileiras começam a “importar” água de outras regiões devido ao esgotamento de seus mananciais, por esgotamento de reservas ou por contaminação.

-a dengue volta a preocupar o Ministério da Saúde, e as secretarias estaduais e municipais, pela ausência de políticas públicas, em todos os níveis, de combate, prevenção e educação da população.

-reformas essenciais ao desenvolvimento da sociedade brasileira, como a política e a fiscal, emperram no congresso nacional, apesar do expressivo número de parlamentares federais e das prioridades sinalizadas, e requeridas, pela Nação Brasileira.

-1/3 da carne consumida no Brasil provem de abatedouros e frigoríficos clandestinos, sem certificação ambiental e de procedência, colocando em risco a saúde publica e aumentando a área de pastagem com o desmatamento e queimadas das matas amazônica e atlântica.

-21% das águas de todos os rios brasileiros estão comprometidas por poluição severa e despejo de dejetos, humanos e industriais

-o Brasil será sede da copa mundial de futebol de 2014, e o Rio de Janeiro se candidata a sediar as Olimpíadas de 2016.

-um mundo em choque, e um modelo em cheque, em seus conceitos conhecidos, aponta a urgência das mudanças na matriz de desenvolvimento, e das escalas de extração, produção, consumo e do nível de consciência de preservação.

2-Conceitos sobre responsabilidade, o sócio e o ambiental

-Responsabilidade – conceito jurídico: capacidade de entendimento ético-jurídico e determinação, que constitui pressuposto penal necessário da punibilidade.
Conceito filosófico: situação de um agente consciente com relação aos atos que ele pratica voluntariamente.
Responsabilidade social empresarial é um conceito que engloba os dois anteriores, acrescentando uma gestão ética e que tenha como objetivo de ação empresarial todas as instâncias da sociedade que tenham contato direto ou indireto com as atividades meio e fim da organização, nacionais ou mundiais. Isso inclui até os concorrentes. A gestão ética empresarial visa nortear a empresa em todos os momentos, nas crises e em épocas de expansão de negócios. Deve contemplar a proteção e preservação ambiental, a justiça e a inclusão social, a utilidade e educabilidade de seus produtos e serviços, com processos de reciclagem do lixo pós-industrial e pós-consumo. Além disso, a empresa deve estimular e valorizar a formação e desenvolvimento de uma cidadania empresarial, que incentive o voluntariado e a formação de consciência social plena e atuante.

-Quando falamos do sócio (social) e do ambiental, estamos falando da vida humana e de todas as outras formas de vida, animal e vegetal, que conhecemos e habitam este mundo onde vivemos. O sócio e o ambiental tratam da sociedade humana, de todas as formas de vida que nos cercam, além das formas e manifestações, materiais e imateriais, tais como história, cultura e identidade. Valores, crenças e elaborações conceituais integram, e compõem, também, o patrimônio social e o ambiental, assim como as relações humanas, que são relações sociais. O processo de comunicação humana é uma manifestação social uma vez que é gerado por códigos, símbolos e linguagens, originados e construídos sobre a história e a cultura.

-Uma empresa é uma unidade social produtiva. Ela recebe insumos, os processa, transforma e formata, e os entrega para consumo de seres humanos e animais e para aplicações agrícolas, na forma de produtos ou serviços.

A empresa, de forma mais analítica, é um conjunto de recursos humanos, intelectuais, materiais, financeiros, tecnológicos e de gestão, que, de forma organizada e estruturada, produz bens e serviços para atender necessidades dos consumidores e o bem comum, aí incluído e ambiente natural e sua preservação, buscando obter rentabilidade e lucro em seus investimentos e aplicações.
A busca cega e desmedida, somente por lucros e ganhos, é a ganância, que leva à corrupção e à destruição das estruturas sociais.

Os grupos sociais, portanto, que a compõem, e complementam, são a sua equipe, os fornecedores, seus clientes e consumidores, os investidores, os funcionários de estado e governo, que a controlam e fiscalizam, bem como associações, sindicatos e outros.

Sua atuação, tanto em suas instalações, como na busca por mercados, se dá em locais físicos e em ambientes, construídos ou naturais.
Portanto, uma empresa é uma unidade social produtiva, que transforma, formata e agrega valor a insumos, visando atender necessidades sociais e ambientais, na busca de rentabilidade e lucro.

O Estado, fora as religiões, é o primeiro grande pacto ético importante e vital na construção de civilização e avanço. O coletivo com códigos de regras e elencos legais, aos quais o ser humano se submete para diminuir a subjetividade e melhorar a qualidade de vida de todos. O estado é uma criação do ser humano para servi-lo na ordenação da conduta humana.. É o conjunto de instituições permanentes, tais como as três dimensões de poder, criados com a visão do equilíbrio democrático: judiciário, legislativo e executivo. O executivo (governo) é a parte transitória do estado. Ele é o gestor executivo temporário, renovado por eleições, que tem a função de gerir as estruturas de gestão dos níveis coletivos da sociedade. Ao construir o conceito de estado, o ser humano o faz frente à complexidade gerada pela urbanização, concentração e escalas de produção e consumo.

Ao conceber o Estado, o ser humano cria um agente forte, com poder de polícia, mas que tem que ser controlado e desenhado, permanentemente, pela sociedade. Assim, nasce a visão do controle social. Ao estado cabe a ordenação da conduta humana e ao humano cabe o controle social sobre as atividades do estado. Isso faz com que se desenvolvam conceitos e doutrinas, referenciais teóricos e códigos escritos, para que à enorme concentração de poder, nas mãos de Estado e governos, se anteponha o controle e avaliação de suas atividades. Nasce o controle social organizado na forma de sindicatos, associações e vários tipos de movimentos sociais, previstos em lei.

A urbanização, após a vida nos campos e nos burgos, requer novas estruturas e o mundo passa da era do reis para as leis, dos burgomestres e xerifes, que a todos conheciam, para novas estruturas de gestão da coisa pública, baseadas na relação impessoal e nas leis. Os reis são limitados em seu poder outrora absoluto, pelos parlamentos e surge o orçamento público, como peça de limitação do poder governante, e como controle da aplicação dos impostos, dentro das prioridades da sociedade. O poder discricionário é substituído pelo poder representativo das vontades das pessoas e são criados os mecanismos de representação e participação.

Com a urbanização, o ser humano é afastado da visão de processo, passa conviver com o conceito de tarefa isolada sem visão do todo, iniciando uma nova etapa de convívio com a natureza. Dela passa a extrair, de forma intensiva e extensiva, todos os recursos de que necessita para a sua sobrevivência. O esquartejamento de seu trabalho em tarefas, lhe retira a visão sistêmica da produção e seus efeitos sobre o meio-ambiente.
O Estado, e governos, bem como as instâncias democráticas de poder, precisam elaborar políticas públicas, para definir, comprometer e atender as demandas sociais.

O que são políticas públicas?
Políticas publicas, são demandas sociais legitimas e pertinentes, previstas em leis e contidas em orçamentos públicos. As demandas sociais precisam da legitimação pelo controle social, para evitar seu uso manipulativo e eleitoreiro. Toda política pública deve seguir e acompanhar a dinâmica social, para evitar o engessamento de questões cruciais, por questões locais, temporais ou contextuais.

A omissão histórica, e sistemática, do Estado sobre certas áreas e segmentos da sociedade civil gera distorções sócio-econômicas e sócio-ambientais, que permitem o surgimento de grandes bolsões de miséria, de agressão, devastação e falta de preservação ambiental, de crianças sem escola, de trabalho escravo, de grandes privilégios para alguns interesses privados, em detrimento do coletivo.
Essa omissão, e falta do cumprimento das missões constitucionais, passa a oferecer espaços e oportunidades para a ação organizada, de pessoas e empresas, que, exploram o verdadeiro estado paralelo do crime, do tráfico (de pessoas, armas e tóxicos). Além do estado paralelo a omissão e enfraquecimento do Estado formal geram o fortalecimento do “terceiro estado”, ou seja, a ação corrupta e especulativa dos grupos empresariais que dominam grandes capitais voláteis, quebram bancos, arruínam economias de países e ainda obtêm, e saqueiam, favores e aportes financeiros dos Estados, para manter a “normalidade” de crédito.

É importante lembrar que o cidadão é que mantém o estado e governos com seus impostos, na sua dimensão de contribuinte. Na dimensão de consumidor, ele mantém as empresas para que elas produzam os bens e serviços necessários ao seu alimento, abrigo, transporte e bem estar. O cidadão é a figura central de toda e qualquer sociedade, pois o dom da vida que a pessoa humana tem, lhe oferece, em um único ser, todas as dimensões conscientes de mãe, pai, filha, filho, trabalhador, estudante, contribuinte, consumidor e eleitor.

Estado e empresas, portanto, foram criados, vivem e se alimentam, e realimentam, com os recursos e riqueza gerados pelo trabalho das pessoas.
Assim, Estado e empresas, para devolver em serviços públicos e privados, tudo aquilo que auferem das rendas e impostos geradas pelo trabalho, têm a obrigação de, em conjunto, ou separadamente, porém sempre articulados, oferecer ações e soluções, para os pleitos e necessidades da cidadania. Estado e mercado são virtualidades. O real são as pessoas e suas necessidades.

Estado e empresas podem, e devem, ajudar na concepção e implantação de políticas públicas, que venham a complementar os requisitos sociais, de desenvolvimento justo, equilibrado e sustentável.

3-Projetos sócio-ambientais/empresariais

Por coerência entre conceitos e ação, e para dignificar as atividades sócio-ambientais, os compromissos assumidos pelas empresas devem constar da missão da empresa e de seus valores e visão.
A área responsável por essas atividades e projetos, deve fazer parte da estrutura formal da empresa, com previsão orçamentária para suas ações.
O desenvolvimento de projetos deve partir de pesquisa sócio-ambiental para definir os objetos, de forma articulada com a realidade social.
Não se recomenda iniciativas unidirecionais, que partam unicamente da visão interna da empresa. Deve acontecer a devida pactuação com a região, área, e segmento, onde as atividades serão desenvolvidas.
Os projetos e ações de responsabilidade sócio-ambiental empresarial só devem ser implantados e desenvolvidos, se tiverem pertinência e legitimidade. Checar esses conceitos garante coerência das ações com as realidades ou dimensões atendidas.
O apoio e incentivo para a formação de uma cidadania empresarial deverá contemplar, permanentemente, a ampliação da consciência social e a capacitação de todas as equipes.
Tanto os grupos internos como os grupamentos sociais, objetos dos projetos, deverão ser envolvidos e estimulados para desenvolver o sentimento de pertencimento e de interatividade com a empresa, como agente de transformações sociais.
Na área de RH, as empresas devem criar mecanismos de premiação e reconhecimento dos cidadãos empresariais, previstos no mecanismos formais da organização.
Todo projeto sócio-ambiental empresarial só será validado se passar por processos de avaliação e de aplicação de implementações e feedback.
Os projetos deverão merecer a devida divulgação, através do balanço social da empresa e de iniciativas e eventos específicos, onde a sua publicização servirá de prestação de contas à sociedade e de estimulo a outros empreendedores. Os documentos formais da empresa tais como contratos, orçamentos, correspondência e comunicados, deverão ser instrumentos complementares da divulgação das iniciativas sócio-ambientais. Esses instrumentos deverão abranger todos os agentes, direta e indiretamente envolvidos com a vida da empresa e suas repercussões.

4-Proposta de priorização para projetos sócio-ambientais

a) questões de gênero – promover a igualdade de gênero e a autonomia das mulheres
b) meio ambiente – projetos que eduquem, conscientizem e estimulem a preservação do patrimônio natural e que se engajem na luta contra o aquecimento global e a emissão de gases tóxicos
c) combate à corrupção – ações que eduquem e ajudem a repelir a corrupção em todas as atividades – programas de transparência no uso de recursos públicos
d) inclusão e justiça social
e) primeiro emprego para jovens

5-Reflexões

-o que fazemos e para o que viemos nesta vida?
-a vida é uma aventura, da qual sairemos todos mortos.
-qual a razão, então, de buscar acumular bens materiais, de conviver pouco com as pessoas que amamos, de não cuidar de nossa mãe terra adequadamente, se nada disso levaremos para depois de nossa morte?
-o que estamos fazendo para passar um mundo melhor, para nossos descendentes, do que aquele que recebemos de nossos pais?
-ainda mais que nossos descendentes, que herdarão esse mundo, serão nossos filhos e netos?
-o que estamos, ou poderemos fazer, para que a vida se perpetue, com boa qualidade, e com as condições necessárias para que todos possam viver essa ventura que é a vida?

6-Conclusão

a)Após a idade média e todo o obscurantismo que o poder utilizou para frear a liberdade de pensamento e criação, a sociedade humana reagiu com o iluminismo, com revoluções libertadoras e com a criação do conceito de Estado, como um grande pacto ético para a construção do espaço coletivo.
A humanidade saiu dos reis e foi para as leis.
Dos gastos arbitrários de recursos dos impostos, para o orçamento público.

b)Depois dos horrores das duas guerras mundiais, no século XX, foi criada a ONU. uma organização mundial e multi-lateral, para harmonizar e regular as relações entre países.

c)Após as duas grandes crises do século XXI, a destruição da natureza e a especulação financeira, ambas baseadas na busca doentia do lucro, na ganância e na corrupção, sugerimos que se adotem medidas imediatas para que as mulheres passem a exercer, no mínimo, a metade de cargos de poder, nas empresas e governos.
Elas geram e gestam a vida em seus ventres e não criarão guerras nem mandarão seus filhos para morrer e cuidarão melhor da sua semelhante Mãe Terra, ameaçada pelo modelo masculino e viril, que tivemos até então.

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