sexta-feira, 7 de novembro de 2008
Verbas difíceis, verbas fáceis e "risco sistêmico"
Freqüentemente, assistindo a TV Senado, a TV Câmara dos Deputados, a TV Assembléia ou a Tv Câmara Municipal, nos deparamos com algumas propostas de reforço dos orçamentos públicos para as áreas de saúde, educação, segurança, meio ambiente e sistema prisional/penitenciário. Veementes reações contrárias dos legisladores, que eventualmente defendem os governos pressionados a remanejamentos e repasses, são captadas, e sempre com a contra argumentação já desgastada de tão repetida: a fonte da receita para essas novas “aventuras”deve ser indicada por quem as propõe. Assim, grandes demandas legítimas da sociedade são postergadas ou enterradas, pois a falácia intimida, mesmo quando inúmeras emendas de parlamentares são liberadas para as “bases”, num jogo de compadrio e casuísmo. A realidade tem nos mostrado, de forma eloqüente, e dramática, a necessidade que as áreas acima, apresentam para receber reforço de recursos. Os professores ganham mal, os policiais arriscam suas vidas para dar segurança à vida e ao patrimônio da população em sua luta contra o crime, os sistemas carcerário e penitenciário se constituem numa chaga vergonhosa contra a recuperação dos infratores e criminosos, as queimadas da floresta amazônica expõem o Brasil como o quarto gerador de calor e emissão de gases e os hospitais e atendimentos públicos, diariamente, ocupam horários nobres da mídia, comprovando a insuficiência da rede pública de saúde, nos três níveis governamentais. Causa espécie, contudo, a forma rápida, ligeira, veloz, imediata, que os muitos bilhões de reais, e dólares, foram liberados, e disponibilizados, para bancos e empresas “em situação de risco sistêmico”. Não foram vistos os representantes das bancadas governamentais inquirirem os remetentes da proposta com as tradicionais perguntas sobre a origem dos recursos e as fontes de receita para tais aportes. E não foram os pequenos dois bilhões para a saúde, nem os outros poucos bilhões para pagar professores, muito menos os alguns bilhões para melhorar a vida dos policiais. Até agora foram muito bilhões, entre depósitos compulsórios, compra de dólares americanos, leilões de dólares para segurar seu preço e ajuda, até, para empresas privadas da construção civil. Após a leitura desses dados, fica a pergunta: o que é um “risco sistêmico” para a sociedade? Será a eventual redução de lucro dos bancos, a quebra ou concordata de algumas empresas que oferecem produtos e serviços utilizando recursos de que não dispõem? E professores mal pagos, não podendo educar as gerações futuras não se constituem em “risco sistêmico”? Policiais mal pagos, jogados na luta contra o crime, sem salários e condições dignas de trabalho não são um risco sistêmico para toda a sociedade? Trabalhadores desempregados, cidadãos que não podem pagar suas contas mensais, e que perdem automóveis, casas e bens para seus credores, não são “risco sistêmico”? Pais e mães que apesar de trabalharem muito e não conseguirem pagar em dia a conta das escolas dos filhos e, por isso, passam a integrar banco de dados como maus pagadores, não são”risco sistêmico”? Pequenos empresários, geradores de empregos, impostos e circulação de riqueza, com dificuldade de saldar suas folhas de pagamento, com pouco capital de giro para expandir e implantar inovação em suas organizações, não são “risco sistêmico”? Estudantes e recém formados, que não conseguem seu primeiro emprego ou recebem salários de fome, explorando suas capacidades e competências, a preço vil, não são “risco sistêmico”? Talvez “sistêmico”, nas situações de muitos bilhões, se refira às instâncias próximas do “sistema” de poder e não à visão sistêmica de toda a sociedade civil, que paga seus impostos, mesmo que, sistemicamente, mal utilizados.
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2 comentários:
Por "sistema" infelizmente devemos entender "todo o sistema próximo ao poder do sistema"... Se não estiver no topo da pirâmide, abraço... Adorei o artigo. Abraços.
Vivo me perguntando sobre isso: quem ou o que é esse "sistema" que as pessoas temem, julgam as vigiar, punir, que está sempre em risco e por isso merece ser preservado acima de todo o resto? "o sistema" somos nós e tudo que queremos preservar de ruim, de hipócrita... é uma resposta fácil para nossas fraquezas, para nossa falta de coragem, para o nosso lado "lobo", quando pegos em flagrante delito ainda podemos dizer de forma resignada:"é tudo culpa do sistema"...
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