segunda-feira, 25 de abril de 2011

Desastres Naturais, Risco Ambiental e o Binômio Probabilidade X Consequência

A emocionalidade e o imediatismo são ingredientes questionáveis quando se precisa avaliar opções para investimentos, que possam envolver grandes impactos ambientais, investimentos elevados, promessas de muitos empregos e dispensa de obrigações públicas e isenções fiscais.
Mobilizações políticas e de lideranças da sociedade, precisam de bom embasamento especializado técnico/científico para balizar posições assumidas e dimensionar riscos, probabilidades e conseqüências.
Nas empresas, de acordo com pesquisa divulgada por John Elkington, autoridade reconhecida mundialmente em sustentabilidade, apenas trinta por cento dos executivos estão realmente envolvidos e procurando soluções novas para a questão da ação industrial sobre o ambiente natural.
Em várias organizações os programas de responsabilidade social corporativa muitas vezes são interpretados, ou confundidos, como se a empresa adotasse práticas sustentáveis.
Também não se pode interpretar o equilíbrio entre o produtivo, o social e o ambiental, como uma política sustentável efetiva e correta.
As atividades empresariais e seus conceitos, muitos deles ainda dos séculos XIX e XX precisam se reciclar, e atualizar, para a complexidade do momento que se vive, e para o futuro que está sendo deixado para as próximas gerações.
Um dos principais aspectos a ser estudado, profundamente, antes de qualquer pronunciamento, ou aprovação de novas plantas industriais, é o relativo a um sério e abrangente estudo sobre o risco ambiental.
O risco é diretamente ligado a dois fatores fundamentais: a probabilidade de ocorrência de acidente e a conseqüência que possa decorrer.
Assim, a equação (risco ambiental = probabilidade x conseqüência), nos daria uma avaliação realista de todos os fatores envolvidos, evitando a superficialidade e o imediatismo em posições assumidas.
Um investimento pode representar uma probabilidade baixa de acidentes, mas a avaliação das possíveis conseqüências danosas, mesmo de um pouco provável acidente ambiental, pode nos colocar em posição de muita cautela, pois mesmo distante da implantação, uma conseqüência pode ser muito destrutiva em termos de vidas humanas e danos ambientais.
No vale do Itajaí a ocupação, nos 20 anos depois das enchentes de 83 e 84, das encostas e topos de morros apresentou, aparentemente, baixa probabilidade de acidente por um bom tempo.
Só que as conseqüências, quando vieram, foram catastróficas e letais, em grande escala.
Os custos elevados em vidas, o abalo social e psicológico, a queda da produção industrial, o elevado custo público denunciaram, com muito atraso, que a aparente baixa probabilidade constatada nos anos oitenta, foi superada de forma surpreendente e brutal por uma conseqüência mal avaliada duas décadas antes.
Esse é outro aspecto importante.
Muitas vezes a distância cronológica entre a baixa probabilidade de acidente, na fase da implantação e a conseqüência faz com que não se estabeleça uma relação, de causa e efeito, entre esses dois fatores.
Por isso ambos devem ser muito bem estudados na fase de licenciamento de qualquer investimento, evitando que o entusiasmo imediato substitua a informação científica e de boa qualidade técnica, que poderá alertar para quadros como o que causou grande destruição em Blumenau e região em 2008, e que ainda registra metástases humanas, com pessoas e famílias vivendo em situações provisórias, e verbas prometidas, a posteriori, e ainda não repassadas de todo.
E tudo com um custo ambiental exponencial, se comparado ao que se teria investido em educação ambiental e relocação de casas e pessoas para que os morros não fossem comprometidos com a remoção da cobertura verde nativa.
Normalmente, a análise do aspecto puramente econômico deixa um bom número de lideranças e representantes políticos muito animados com as possibilidades de alguns milhares de empregos, de discutíveis valores de impostos a ser recolhidos diante das promessas das administrações municipais de renúncias ou isenções tributárias.
Muitos aspectos puramente subjetivos, como a vaidade de governantes e entidades associativas, pesam significativamente mesmo quando a prudência recomendaria a contratação de estudos altamente especializados, de técnicos e pesquisadores das nossas boas universidades e de centros de pesquisa, neutros e isentos.
O recente acidente com uma plataforma de captação de petróleo de grande profundidade, nas costas da parte sul dos Estados Unidos, é uma demonstração que a fórmula (risco = probabilidade x conseqüência) não foi devida e preventivamente estudada.
A tecnologia utilizada pela BP, supostamente já bem dominada ao longo de muitos anos, gerou um relaxamento na avaliação da possível conseqüência de um acidente, numa profundidade de 1.500 metros, menor que muitas outras sondas que são utilizadas em fossas marítimas mais profundas.
Os resultados ai estão, sobejamente noticiados e fotografados pela mídia mundial, que atesta o horror da destruição ambiental, numa vasta região que levará, se conseguir em sua totalidade, se reequilibrar ambientalmente ao longo de, no mínimo, meio século de bem trabalhadas providências.
E tudo a um elevado custo para os cidadãos e seus impostos.
Ou seja, os aparentes ganhos inicialmente constatados, foram apagados pela destruição em escala gigantesca.
A conseqüência, e eventuais dispositivos para combate-la, foram menosprezadas pelo investidor, e governo norteamericano, considerando que, até então, aquele tipo de probabilidade era, estatisticamente, muito baixa.
É lógico que a sociedade humana, às vésperas de contabilizar seus sete bilhões de seres sobre a face da terra, necessitando de alimento, abrigo, roupa, saúde e trabalho, precisa pensar em escalas que venham a atender esse quadro dos próximos 50 anos, quando poderemos chegar aos 9 bilhões.
Mas não podemos mais ignorar e desconsiderar que a exaustão das potencialidades de nosso patrimônio ambiental está chegando ao seu limite, diante deste modelo de escala que ai está e, que se quisermos sobreviver, como raça humana, teremos que abandonar visões ultrapassadas ou imediatistas, para construir uma nova relação de produção e consumo, que respeite as limitações de nossa Terra.
Não será muito difícil, se nos dispusermos a estudar e ouvir os cientistas e técnicos, que, há muito tempo, pesquisam e estudam o novo mundo possível.

segunda-feira, 4 de abril de 2011

JUAREZ É AQUI - TEXTO DE MARISA NASPOLINI

Este texto é da amiga Marisa Naspolini e o publico neste blog pela importância dele em nossa atualidade.


Juarez é aqui
Juarez é uma cidade situada no estado mexicano de Chihuahua, na fronteira com os Estados Unidos, que tem frequentado os noticiários mundiais nas duas últimas décadas por conta do feminicídio atroz praticado contra suas cidadãs. Mais de 500 mulheres e meninas já foram barbaramente abusadas, mutiladas e assassinadas, sem que qualquer atitude concreta tenha sido tomada pelas autoridades mexicanas para evitar a perpetuação da matança.
Há todo tipo de teoria para “explicar” a barbárie: tráfico de órgãos, comércio sexual, disputa entre cartéis de narcotráfico, corrupção policial, snuff movie, entre outros, mas até hoje nenhuma investigação foi levada a cabo para elucidar quem (e por que) está por trás dos rituais macabros.
A diretora teatral galesa Jill Greenhalgh criou uma performance tratando deste tema. O espetáculo, feito apenas por mulheres, já foi realizado em vários países (Colômbia, Peru, Espanha, Argentina, País de Gales) como fruto de uma oficina ministrada por ela. O resultado é particularmente poético. De forma inteligente, e estratégica, Jill se apropria dos opostos para chegar onde deseja. De acordo com suas próprias palavras, “para evocar o horror, preciso encontrar algo extraordinariamente belo, para trabalhar com a morte, preciso levar em conta a ressurreição, para provocar medo, preciso criar um lugar seguro”.
A performance, intitulada The Acts (Os Atos, numa referência direta à necessidade de agir em relação a esse estado particular de coisas), é feita de presença e silêncio, de imagens fortes que emudecem o espectador em sua (im)potência. O resultado é denso, tocante, mexe na ferida com luvas de pelica.
O caso do México é emblemático pela quantidade de vítimas na mesma cidade e pela violência extrema dos atos praticados contra elas. Mas o panorama brasileiro é igualmente aterrador. E a Santa e Bela Catarina – referência nacional na qualidade de vida (!!!) - parece ocupar lugar de destaque nessa competição insana. Há duas semanas, em Florianópolis, o sergipano Claverson tentou asfixiar a namorada Maria de Fátima dentro do elevador, segundo ele porque ela havia terminado um namoro de oito meses.
Como as imagens ganharam o noticiário nacional, números impressionantes vieram à tona. De acordo com a Secretaria de Segurança Pública, em 2011 já foram 2.587 casos de violência contra a mulher em Santa Catarina, a grande maioria cometida pelo “companheiro”. Em SC, uma mulher é vítima de violência doméstica a cada 46 minutos. Dá pra imaginar?
Alguns dias depois uma mulher foi seqüestrada na Palhoça a caminho da escola do filho. Como não conseguiram retirar o dinheiro pretendido do caixa eletrônico, os bandidos decidiram estuprá-la, meio assim, pra não perder a viagem. A vítima salvou-se graças a um motivo torpe: ao perceber que ela tinha pontos de uma cirurgia feita recentemente no abdômen, acharam nojento tocar “naquilo”.
A atriz e dramaturga italiana Franca Rame escreveu uma coleção de monólogos para mulheres. Um dos mais conhecidos é O Estupro, que recebeu montagem antológica no Brasil, nos anos 1980, por Marília Pera. O texto faz uma descrição física e psicológica detalhada da tortura do ponto de vista da mulher e termina com a vítima recém-estuprada em frente à delegacia, machucada, exaurida, pensando se entra ou não para dar queixa. Ela imagina os olhares cínicos sobre ela, as piadas contadas pelos policiais de plantão e desiste. Amanhã, quem sabe...
Marisa Naspolini

Florianópolis, 2 de abril de 2011
Marisa Naspolini - no Diário Catarinense-DC