sexta-feira, 17 de outubro de 2008

Viagem a um país chamado passado-uma casa em Ipanema

18 março de 2005.



Hoje viajei 30 anos. 30 anos de exílio se passaram, 30 anos de saudade me assolaram,

30 anos de vazio me cobraram

Não comprei passagens, não visei passaportes, não paguei taxas de embarque .

Mesmo assim, viajei .

Abri a caixa e embarquei nas fotos .

Revi pessoas, visitei lugares, casas, ruas, árvores e praias .

Reencontrei gente, pessoas muito amadas e queridas, alguns mais velhos,

outros bem mais jovens, enfim, amigos, familiares, muitos familiares .

Mas, principalmente, vi três filhos, meus três filhos, três crianças lindas,

crescendo, brincando, estudando, se formando, na vida e escolas, e pro-

curei olhar seus olhos, tentei captar seus sonhos, suas ansiedades.

Queria reencontrá-los, ouvi-los, saber deles como brincavam, o que sen-

tiam, quando voavam em suas bicicletas, quando andavam em seu carrinho

de rolimã, quando subiam e sonhavam nas árvores, quando adormeciam

nas viagens, quando acordavam e olhavam a estrada pelo vidro traseiro,

quando eram carregados para suas camas, profundamente dormidos, envol-

tos naquele sono bom, que só as crianças conseguem ter

Tentei me ver criança, me rever adolescente, me reencontrar adulto .

Tentei encontrar meus pais, a casa de meus pais ...

Tentei reconstruir a casa, aquela casa dos sonhos e das esperanças.

Aquela casa da qual saiam os barcos para velejar e pescar.

Aquela casa próxima ao Guaíba.

Aquela casa, que do portão se via o rio.

Aquela casa da qual víamos o céu através dos cinamomos .

Aquela casa na qual o vento cantava com as folhas dos eucaliptos .

Aquela casa da qual saíamos para a escola, para o clube, para outras casas .

Não encontrei .

São outras casas, outros rostos, outras ruas, outras árvores .

Tantos anos se passaram, prisões, seqüestros, fugas e diáspora

O pai partiu, a mãe vive em outra cidade, os irmãos por todo o país.

Ninguém ficou .

Onde está aquele tempo ?

Onde ficou aquele lugar ?

Onde estamos todos nós ?

Queria rever seus rostos,

perceber suas expressões

ouvir suas vozes

reviver a algazarra

partilhar seus sonhos

viver alguns momentos , talvez um churrasco de domingo...

ver nossos pais, ele sentado na varanda, matutando sobre a vida, dialogando com o

vento, ela ao piano, a música, aqueles sons tão próximos, e que nos levavam para
sonhos tão distantes...

3 comentários:

roseti disse...

quase morri de espanto quando me deparei com "uma casa em ipanema". Também morei lá dos 3 aos 21 anos. Será que nos conhecemos?! Quanta coisa boa tinha ipanema. Tive uma infância e adolescência maravilhosas lá. Brincar só na calçada, muitos passeios de "bici". Aprendi a nadar no Guaíba. Fico imaginado qual seria tua casa! Conte mais.....

Unknown disse...

Danilo!
Vivemos normas, mudanças imprevisíveis impostas pelo tempo. E o passado insiste em nos povoar de recordações, umas amargas, outras felizes. Na viagem ao passado, rumo ao nosso mundo de lembranças que é só nosso, contactamos com nossas raízes, com nossas dependências afetivas. E nessa viagem, à medida que nossas lembranças vão se aflorando, percebemos que muito do que lembramos já não nos pertence mais. E aí a saudade, a alegria, a tristeza invade a alma. Aguçamos nosso paladar, nosso olfato, e nosso coração pulsa, pulsa. Queremos, às vezes, permanecer na casa do tempo e reviver nossas lembranças. Mas não dá. E, assim, seguimos a vida.

Grazi Aronovich disse...

Querido Danilão,
meu irmão querido!só hj 3 anos e meio após tua escrita, leio este texto lindo.
a dinãmica da vida é assim, pra frente, crescendo, desenvolvendo, deixando a infãncia, o mundo tão gigante pequeno.
a vida nos leva por novos caminhos poéticos, novos encontros, nova familia,de amigos escolhidos e que nos escolheram. é a vida.quem é novo envelhece, quem já está maior, se vai.
e nós que aqui estamos, temos escolhas a fazer:viver ou lamentar o tempo que passou.como diz caetano Veloso, tem saudade quem viveu muito!
lembro de Ipanema com carinho, mas não tenho saudade. tenho saudade do pai, mas não dele lá sentado na varanda. sinto saudade das pessoas, mas não dos locais, pois as pessoas a gente pode rever e viver novos momentos de vida e os lugares, eles mudam e não tem mais nada a trocar conosco.
é bom construir novosd sonhos, novos tempos e encontrar as pessoas em seus estagios atuais.mesmo que em estes estágios a gente tenha pouco em comum pra brincar.é a vida, mais forte que nossas vontades, mostrando que a beleza de viver está em se adaptar ao inusitado que ela nos apresenta.
bjo muito carinhoso e querendo que a vida nos apresente mais pessoas lindas pra conhecer
Gra